quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A Recoveira

Início do 8º Episódio

O Fateixa tentou levantar-lhe a cabeça para puder respirar melhor. Seguidamente, faz sinal ao mestre da barca para atirar uma bóia.

Fateixa - Levante mais a cabeça Ti Manel, coragem homem ! Você nã’ me ouve? Valha-me Deus,

parece que ele já ‘tá morto!

Com a ajuda da tripulação o náufrago foi recolhido com alguma dificuldade, mas a alta ondulação não facilitava esta operação. Um tripulante mais entendido prestou os primeiros socorros ao Ti’ Manel.

O arrais depois de verificar que não se avistava mais nenhum corpo, resolveu encalhar e mais uma vez o Arrais tinha que enfrentar a fúria das ondas.Os bombeiros esperavam na praia pelos acontecimentos. Depois do encalhe da barca sem problemas, a ambulância seguia a toda a velocidade com o Ti’ Manel para o hospital.

O Fateixa, ainda na barca, junto dos seus companheiros, sentia-se muito triste.

Nas suas mãos, estavam dois pedaços de madeira que ele tinha encontrado aboiado no mar, enrolados a umas camisolas já usadas.

- Desabafava com um amigo:

Fateixa - Já viste este exemplo, o Ti’ Manel estava agarrado com unhas e dentes a isto, qu’eu nã’ consegui tirar. Vou levar p’ra casa e s’ele viver um dia mais tarde vou mostrar-lhe que o ajudou a salvar.

Nossa Senhora tenha pena dele, apesar do qu’aconteceu comigo e c’o sê’ filhe João, nã’ lhe deseje mal nenhum.

Amigo - Já viste Fateixa, o João ainda ‘tá no hospital e agora foi p’ra lá o pa delei!

Fateixa - É verdade, olha qu’eu nã’ me tinha lembrado disse!

Na praia, todos os presentes estavam apavorados, ainda faltavam cinco homens, grande parte da multidão já não tinha esperança de encontrar algum sobrevivente.

O Salva Vidas continuava na praia. Ao primeiro sinal voltava novamente ao mar.

Alguns pescadores corriam o areal, de norte a sul, recolhendo os destroços que o mar sacudia para a praia, mas náufragos, nem sinal.

O Fateixa, ainda abatido, dirigia-se para a sua casa, a ceroula e a camisola encharcada, fizeram-no arrefecer. Na mão levava o objecto que ajudou o Ti’ Manel a flutuar.

Os amigos dirigiam-lhe palavras de louvor, mas o seu pensamento não se desviava do acidente, estava realmente bastante comovido.

Fateixa - Cada vez qu’eu penso qu’o Ti’ Manel andou agarrado a iste... deve ter sido um milagre!

A Joana, a mãe do Fatecha, encontrava-se em casa, chorava sem ter coragem de ver o mar. Quando o filho entrou em casa abraçou-o sem ter vontade de o largar.

Fateixa - Pronte mãe, qu’é isse? Afinal eu ‘tou aqui vivo!

Joana - Pois ‘tás filhe. A nossa vezinha já me disse o acontecido.

Graças a Deus ajudaste a salvar o Ti’ Manel, parece um grande exemplo na nossa vida.

Ouve cá, o qu’é iste que trazes aí?

Fateixa - Olhe, foi iste quem ajudou o Ti’ Manel a salvar-se.

Encontrei-o com estes paus entre os braços, aboiado no lance da Moiteira.

A Joana ao ouvir a notícia quase desmaiava ao ver aqueles pedaços de madeira enrolados a um pano, mas não queria acreditar no que os seus estavam a ver:

Joana - Valha-me o Santíssimo Sacramento, iste foi um milagre filho, nã’ pode ser outra coisa.

Fateixa - Mas o qu’é isse mãe, você parece que nã’ sente bem?

Joana - E não filhe, nã’ tou mê’me.Dê’xa-me assentar antes que caia no chão!

Fateixa - Mas que rai’ vem a ser iste?!

Joana - Dá-me um pouco d’áuga filhe, eu já te conte tude!

A gente tem qu’ir al’miar os santinhos e a Nossa Senhora.

Fateixa - Espere aí qu’eu nã’ tou a entender nada!

Joana - Ai, ai, dê’xa filhe, dê’xa lá, que nós temes aqui ‘ma surpresa e s’o Ti’ Manel se salvar, cá p’ra mim foi um grande milagre.

Eu sê’ que tu nã’acreditas muite nos santes, mas desta vez vais mudar de opinião!

Fateixa - Olhe, se quer que lhe diga, cada vez percebe menos.

Espere aí qu’eu já vanhe, tão a gritar ali em ba’xo, eu vou ver!

Realmente era verdade. Uma mulher subia a rua na direcção da casa do Fateixa. Este, ao mesmo tempo, assustava-se, pensou o pior.

Amélia - Fateixa, à Fateixa, o mê’ homem ‘tá salve. o Ti’ Manel vai viver graças a ti e à Virgem de Nazaré.

Agredeço-te de todo o mê’ coração e peço-te perdão por tudo qu’aconteceu.

O mê’ Manel disse-te tantas coisas desagradáveis e até já tínhamos raiva de ti.

Peço-te perdão, mais uma vez!

A Amélia ficou abraçada ao Fateixa durante algum tempo, estava bastante comovida.

O jovem aconselhou-a a entrar em casa para a tranquilizar.

O Fateixa ficou mais animado com a acção da Amélia e, depois do diálogo acompanhou-a a casa.

Pouco depois ele voltava á praia, agora com menos gente mas a angústia era a mesma, marcava no rosto de cada um.

Os destroços, amontoados junto à muralha reavivava a memória da tragédia.

A Maria da Nazaré, sem que o Fateixa reparasse, seguia -o de perto.

O Fateixa, olhando o mar, ainda resmungando como se ainda não estivesse satisfeito, continuava com a sua fúria.

Fim do 8º Episódio

J.B.

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