segunda-feira, 22 de agosto de 2011

5º e último Episódio- A Censura-

5º Episódio e último Episódio.

Entretanto, o Mestre Fernando conversava baixinho com a sua esposa e, ao mesmo tempo, disfarçadamente, ia observando a porta de entrada da taberna.

Alberto preparava-se para começar quando, inesperadamente, entraram dois Guardas Republicanos.

– Em nome da Lei, para já a cegada. Quem é o responsável?

A assistência ficou sem palavras mas, alguns revoltados, assobiavam a atitude da autoridade.

Disfarçadamente, o Mestre Fernando esfregava as mãos de contente, exprimindo alguns protestos pouco significativos.

A autoridade continuava a insistir na pergunta que inicialmente tinha colocado.

- É melhor o autor identificar-se imediatamente!

– ‘Tá aqui o autor Senhor Guarda. Mas, afinal o que quer o Senhor de nós? É a primê’ra vez que vejo ‘ma coisa destas no Entrude, nós nã’ ‘vamos aqui a ofender ninguém !

– Nós estamos aqui a cumprir ordens de alguém. Faça o favor de me apresentar a autorização da Câmara da exibição desta cegada.

O Alberto sentiu-se morrer e, a assistência, num continuado protesto, abafava as palavras da autoridade.

O Mestre Fernando fez sinal à sua esposa e à sua filha, Maria, para saírem da taberna. O Alberto, sem mostrar resistência, disse:

– Eu tenho aqui os papeis da cegada que neste momento íamos começar. Já nã’ tive tempo de levar à Censura. Desculpe lá isse. A gente ‘tava aqui a divertir-se, nada mais.

A autoridade, depois de verificar os papeis, disse:

– Olhe amigo, o senhor não pode continuar porque, segundo eu reparo, o texto não está censurado pela Câmara para representar publicamente.

Agora, o Senhor tem um prazo de dois dias para se apresentar no Posto, para ser ouvido. O texto da cegada vai comigo e, depois se verál a solução.

Se quiser um conselho não tente apresentar a cegada em qualquer lugar público, se não, terei que actuar de maneira diferente.

Pouco depois, a taberna do Senhor António, ficou deserta mas os protestos do povo podiam-se ouvir mesmo ao longo das ruas próximas.

Já em casa, a Maria pergunta ao pai:

– À mê’ pai, mas afinal o qu’aconteceu? Foi ‘ma coisa muite estranha, o Guarda chegou ali e mandou parar a cegada, mas porquê?

– À filha, nã’ me preguntes qu’eu nã’ sê de nada.

Olha, é melhor a gente calar-se porque com ó’teridades, eu quer ‘tar longe delas. O que for há-de se saber.

– Ai, mas eu tenho tanta pena dos rapazes. Há mais dum mês andam a ensaiar, p’acontecer agora iste!

Entretanto, o Alberto, depois de reunir-se com os seus companheiros, resolveu acabar com a cegada.

A mãe do Alberto estava muito assustada e, quando encontrou o filho pediu-lhe muita calma, para não falar sobre a situação.

Dias depois, o Alberto apresentou-se no Posto da Guarda Republicana para prestar declarações. Ele nunca tinha enfrentado a Guarda num caso semelhate ao seu.

– Sente-se se faz favor. O senhor Alberto é acusado de violar a Lei, segundo prova o texto da cegada, não tinha a autorização do Senhor Presidente da Câmara.

E, sendo assim, não tínhamos outra alternativa senão cancelar a apresentação da peça.

Possivelmente, vai-me dizer que ia apresentar uma brincadeira de Carnaval, mas brincadeiras têm limites. O Senhor tem alguma coisa a dizer sobre este caso?

– À Senhor Guarda, a gente nem chegou a começar... Eu só gostava de saber quem me foi denunciar!

– Mas o Senhor pode saber. Quem pediu para intervir foi o Senhor Presidente.

A sua cegada não tinha passado na Censura. E ainda mais, este caso teve a agravante de alguém queixar-se do seu trabalho. Portanto, antes que houvesse algum problema mais grave, o senhor Presidente e para seu bem, mandou proibir a exibição pública do vosso trabalho. Acho que não vai ter dúvidas; Acho que foi a melhor solução antes que houvesse alguém que ficasse ofendido.Se o Senhor não tiver mais nada a perguntar, pode ir à sua vida descansado.

- Está certo, mas o texto que o senhor pode ler não está a ofender nimguém!

- Eu já li realmente o que está escrito nãoindica nomes de ninguém…Deixe lá, para o ano o senhor pode continuar a fazer as suas bricadeiras mas, não se esqueça que tem que passar pela censura. Vá lá à sua vida, e tenha cuidado.

O Alberto saiu muito pensativo.

– Por esta agora é qu’eu nã’ esperava. Nã’ foi senão o pai da Maria, o ganancioso, que me foi denunciar. Tenho a certeza que foi ele! Ou então alguns dos meus companheiros... mas não acredite, eles são meus amigos!

Entretanto, o Alberto chegou a casa silencioso, e o seu rosto muito triste, falava por si.

Depois de contar aos seus pais como tinha corrido a audiência, no Posto da Guarda Republicana, recolheu ao seu quarto a fim de descansar.

A Ti’ Rosa estava intranquila, parecia querer dizer algo ao seu marido. Este, observando a sua esposa, disse:

– Ouve cá Maria, tu ‘tás esquesita... tens ólguma coisa que t’apoquente?

– Olha, eu nã’ me sinte bem enquanto nã’ desabafar!

– Ó melher fala, diz lá... s’é ólgum segredo tu já sabes qu’eu sou um poço!

– É isse mê’me, tu vais-me prometer que nã’ vais contar nada?

João – Já te disse que não. Já ‘tou qu’o sangue a ferver, fala lá!

Ti’ Rosa – Eu vou falar baixinho por có’sa do nosse filho, eu nã’ quer qu’ele saiba diste. O qu’eu fiz até já ‘tom arrependida mas, a intenção era d’ajudar o nosse filhe.

Tu sabes quem pôs fogo ó armazém?

– Eu não, nem ‘tou interessado, já lá vai, já passou.

– Mas p’ra mim não... fui eu que pôs fogo ‘ó armazém.

– O quê? Tu puseste fogo ‘ó armazém?! À rapariga, fala baixo, tu tivestes coragem de fazer ‘ma coisa dessas!

Ti’ Rosa – É verdade, eu nã’ sê’ como tive coragem... pus um pouco de petróleo na gurita, onde entram os gatos, e prontes.

– Eu ‘tou aqui p’a nã’ viver!

– E já agora vai o reste. Fui eu, esta pessoa ‘tá aqui que pediu ó Presidente da Câmara p’a nã’ deixar sair a cegada do nosse filhe.

Eu corri estes perigos todos, por amor ‘ó nosse filhe. Pôs-se-me na cabeça s’o Alberto exibisse a cegada, o ganancioso, o pai da Maria, mandava prender o nosse filhe; ele era homem p’ra isse!

E assim, tude se compôs. Mas ‘ma coisa… O Senhor Presidente garantiu-me que tude ia correr bem.

– Sim, realmente tude correu bem, mas ouve cá... Mas p’ra que foi o fogo no armazém ?

– O fogo no armazém era p’ó Alberto e os sê’s companhê’ros nã’ terem casa p’a ensaiar a cegada.

– Ora tu, Rosa ... Realmente armaste nesta história um grande trinta e um ! Um trinta e um que te podia pôr na cadeia!

Sabes o qu’eu te digo… Vai amanhã al’miar a Nossa Senhora, p’aquilo que tu ‘me ‘tás a dezer.

A Censura foi, ó fim e ‘ó cabe, um grande milagre. Deus queira que o nosse filhe nunca venha a saber disto…Olha admire a tua coragem, mas uma coisa…Tu tiveste muita sorte.

Assim acabou a história- A Censura.

J. B.

Sem comentários:

Enviar um comentário